– Eu odeio meu irmão!!! Quero que ele morra!!! Nunca mais quero ver a cara dele!!!
Quantas vezes escutamos essa frase saindo da boca de um filho e ficamos aterrorizados com a possibilidade de nossos filhos desenvolverem um conflito irreconciliável. Em algumas situações nos sentimos totalmente incompetentes para ajudar e ficamos angustiados.
Em primeiro lugar é necessário ter a consciência que um certo grau de rivalidade é absolutamente normal e natural entre irmãos, especialmente no período da adolescência, onde a diferença de poucos anos entre eles pode significar “anos-luz” de maturidade.
Filhos necessitam do cuidado dos pais por um longo período de suas vidas – na nossa sociedade ocidental, cerca de 15 a 20 anos – para terem plena capacidade de gerir suas vidas. Durante esse tempo eles esperam que os pais estejam atentos às suas necessidades físicas, emocionais, sociais e espirituais, e demandam dos pais muito tempo e diálogo fecundo.
Entretanto os pais precisam dividir esse tempo e atenção entre os vários filhos e com o cônjuge. Isso desperta certa “competição” entre os filhos na primazia desse tempo de qualidade dos pais e sempre que, de alguma forma, sentem-se colocados em um segundo plano, surgem ciúmes dos irmãos.
Pais devem aprender a manejar com esses ciúmes demonstrando aos filhos que cada um tem o seu tempo de qualidade e atenção e que nenhum é privilegiado em detrimento dos outros. Entretanto também é necessário saber distinguir a individualidade de cada filho.
Filhos NÃO são iguais e por isso também não podem ser criados de forma idêntica! Jesus já ressalta isso na parábola do filho pródigo (Lucas 15: 11-32), quando aquele pai, pleno de sabedoria, deixa o filho mais novo ir embora de casa, “quebrar a cara” e voltar arrependido, recebendo-o com carinho e festa, enquanto que, quando o filho mais velho não quer entrar na festa, o pai vai ao encontro dele. O pai sabe que é preciso DEIXAR o mais novo IR e ficar só esperando e ao mais velho é preciso IR AO ENCONTRO.
Essa mesma sabedoria não acontece entre o casal Isaque e Rebeca. A Bíblia relata que quando os gêmeos Esaú e Jacó nasceram, houve uma divisão no interior da família pois, “amava Isaque a Esaú, porque a caça era de seu gosto, mas Rebeca amava a Jacó” (Gênesis 25:28).
Nada pode ser mais desestruturador no interior de uma família que a predileção dos pais por um dos filhos ou, ainda pior, quando um dos pais se apega a um filho e o outro se apega a outro, gerando “coalizões” – que são uma aliança entre dois membros do sistema familiar contra outro membro ou outro subsistema.
Vemos o desastroso resultado desse tipo de aliança na família de Isaque: os irmãos passaram a ter uma disputa contínua ao ponto de se odiarem e Jacó ter que fugir, pois estava jurado de morte por seu irmão Esaú:
E Esaú odiou a Jacó por causa daquela bênção, com que seu pai o tinha abençoado; e Esaú disse no seu coração: Chegar-se-ão os dias de luto de meu pai; e matarei a Jacó meu irmão (Gênesis 27:41).
Esse ódio impediu que Jacó estivesse presente na morte e sepultamento de seus pais e a reconciliação entre os irmãos só aconteceria anos mais tarde, quando os pais já estavam mortos e a disputa pelo afeto dos mesmos já não fazia mais sentido.
Outro elemento ao qual os pais devem estar atentos é com a disciplina justa e honesta dentro da família. Davi não confrontou ou disciplinou seu filho Amnon quando este abusou sexualmente de sua irmã Tamar (II Samuel 13: 1-21). Isso deixou Absalão, outro filho, com muito ódio de Amnon e também do pai por não ter feito nada. Esse ódio culminou no assassinato de Amnon, na rebelião de Absalão e finalmente na morte deste.
Na sociedade do ‘proibido proibir’ a falta de convivência geradora de intimidade relacional, com os filhos, facilmente leva ao exercício do ‘amor fácil’. Nesta prática, os pais tem receio de confrontar os filhos quando estes erram, e procuram resolver as situações conflitantes do convívio familiar ‘deixando pra lá’ ou ‘colocando panos quentes’.
Equivocam-se tais pais ao acreditarem que tais atitudes despertarão o respeito e a admiração dos filhos. Filhos não querem amor fácil, mas querem ser orientados quando falham, ser confrontados com a verdade e sendo genuinamente perdoados quando se arrependem.
Assim sabem que, mesmo humanos e falíveis, podem ser repreendidos e até punidos, mas continuam sendo incondicionalmente amados. Crescer num ambiente onde um modelo assim se pratica os leva a uma pequena compreensão da dimensão do amor de Deus por nós e isso os marcará por toda a vida.
Quando os pais não agem de forma justa, promovendo disciplina quando necessário estão cooperando para o crescimento da divisão entre os irmãos, que pode trazer graves consequências para as famílias – como foi na família de Davi!
Desta forma, pais sábios conhecem as características individuais de cada filho (conhecimento que é gerado por tempo de qualidade na convivência familiar) e também não privilegiam um dos filhos em detrimento dos demais ou sequer deixam de aplicar a justa disciplina quando um filho erra (para não causar aos demais sentimentos de ódio e injustiça). Agindo orientados por esses três princípios, os pais terão maior possibilidade de ter relacionamentos harmoniosos entre seus filhos, ainda que em algumas ocasiões possa surgir pequenos ciúmes ou disputas saudáveis por atenção e cuidado.
Os ciúmes desproporcionais, ódios declarados e brigas que se tornam irreconciliáveis podem ser evitados a partir de pequenas atitudes de sabedoria dos pais. Que Deus nos dê discernimento e capacidade para encontrarmos esse caminho de harmonia!
Prof. Dr. Carlos “Catito” Grzybowski – Psicólogo em Curitiba (PR). Terapeuta familiar, Mestre em Psicologia da Infância e Adolescência, Doutor em Linguística Aplicada. Autor de vários livros, entre eles “Acontece nas melhores famílias”. Coordenador do EIRENE Brasil e diretor do Instituto Phileo de Psicologia. Membro pleno do CPPC. – fone: (41) 999